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Recrutamento e Seleção: Como interpretar os resultados dos testes psicológicos

O tema da interpretação dos resultados dos testes psicológicos é de importância fulcral para todos os profissionais ligados à avaliação psicológica.

Por esse motivo e devido às frequentes dúvidas que continuam a surgir neste domínio, nomeadamente por psicólogos que trabalham na área do Recrutamento e Seleção, decidimos apresentar os passos necessários para a conversão e interpretação dos resultados obtidos por um candidato numa bateria (ou seja, conjunto) de testes psicológicos.

Passo 1 | Obtenção dos Resultados Brutos ou Pontuações Brutas/Diretas

Após a aplicação dos testes, o primeiro passo consiste em obter os Resultados Brutos. Os Resultados Brutos, dizem respeito, por exemplo, ao número de respostas corretas num teste de inteligência ou de aptidões ou ao somatório das pontuações atribuídas às opções de resposta escolhidas numa determinada dimensão de um questionário de personalidade.

Fazendo uma analogia com as consultas periódicas de pediatria, estes resultados brutos ou pontuações brutas correspondem ao peso ou ao perímetro cefálico do bebé.

Em Psicometria, tal como no caso que apresentámos da Pediatria, estes resultados, designados de resultados brutos ou de pontuações brutas, por si só, não nos dão grande informação.

Porque é que em Psicometria não é suficiente considerarmos os Resultados Brutos para o processo de tomada de decisão?
Porque, da mesma forma que o pediatra compara o peso ou o perímetro cefálico com dados de referência da população (de bebés com a mesma idade e do mesmo país) para perceber se o bebé está a desenvolver-se dentro dos padrões normais, também em psicometria é necessário compararem-se os resultados obtidos pelo sujeito avaliado com dados normativos de uma população com características semelhantes (por exemplo, em termos de nível escolar ou de área profissional), para percebermos se este se distingue (ou não e pela positiva ou pela negativa) dos outros na variável que está a ser avaliada (por exemplo a inteligência).

O que é que é necessário para se obterem os Resultados Brutos?
Dependendo do editor, a correção deste tipo de instrumentos pode ser feita com grelhas ou (e esta é a opção mais comum) informaticamente, bastando ao profissional introduzir as respostas dadas pelo sujeito avaliado no sistema informático.
Quando se trata de testes cuja aplicação é feita integralmente em formato digital, este passo não existe já que o sujeito avaliado introduz as suas opções de resposta diretamente na aplicação informática.

Passo 2 | Escolha da tabela de normas com a qual se pretendem comparar os Resultados Brutos ou as Pontuações Brutas

Voltando, uma vez mais ao exemplo da consulta de pediatria, após pesar ou medir o bebé, o médico tem de comparar estes dados com os dados normativos de bebés com a mesma idade. Certamente que não fará sentido comparar o peso ou o perímetro cefálico de um bebé de 6 meses com os dados de bebés recém-nascidos ou de 12 meses.

O mesmo acontece com os resultados dos testes psicológicos: o profissional tem de decidir com que dados normativos pretende comparar os resultados do(s) sujeito(s) que está a avaliar, de modo a poder tirar conclusões válidas sobre esses mesmos resultados e, consequentemente, sobre a variável que está a ser avaliada.

E aqui podem surgir inúmeras questões do género: num processo de seleção, devem comparar-se os resultados obtidos pelos homens com os dados normativos de sujeitos do sexo masculino e os resultados de mulheres com os dados normativos de sujeitos do sexo feminino ou devem comparar-se todos com a amostra global (que engloba sujeitos de ambos os géneros)?

Como é que se sabe quais as tabelas de normas que os testes dispõem?
Qualquer instrumento que seja designado de testes psicológico (ou psicométrico ou psicotécnico) deve dispor de um Manual Técnico onde, para além da indicação das tabelas de normas de referência disponíveis, deve incluir informação detalhada acerca da caracterização de cada uma das amostras que lhes deu origem. Em contexto organizacional, as variáveis demográficas mais relevantes são, para além do número de sujeitos que incluiu a amostra normativa (e que nunca deverá ser inferior a 100), a média e a amplitude de idades, a distribuição segundo o género, o nível escolar (com ou sem especificação das áreas de formação) e, em alguns casos, a área profissional.

Passo 3 | Conversão dos Resultados Brutos em Resultados Padronizados

Com a correção dos testes e consequente obtenção dos Resultados Brutos (passo 1) e uma vez escolhida a tabela de normas que se irá utilizar (passo 2), trata-se agora de converter estes Resultados Brutos em Resultados Padronizados (também designados de Nota Derivada ou Pontuação Transformada).

Para tal, é necessário procurar, na tabela de normas escolhida, o Resultado Bruto (ou Pontuação Direta) obtido pelo sujeito e verificar qual o Resultado Padronizado (ou Nota Derivada) que lhe corresponde.

  • Que tipos de Resultados Padronizados (ou Notas Derivadas ou Pontuações Transformadas) existem?
    Os Resultados Padronizados (ou Notas Derivadas ou Pontuações Transformadas) correspondem a um Resultado Bruto convertido numa escala estandardizada ou padronizada.
    Tal como, quando se fala em temperatura, podem utilizar-se diferentes escalas (por exemplo, podemos medir a temperatura utilizando a escala Celsius, a escala Fahrenheit ou a escala Kelvin), também em Psicometria existem diferentes tipos de escalas padronizadas ou escalas estandardizadas.
    Por exemplo, se se pretender utilizar uma escala facilmente convertível em categorias qualitativas, podem converter-se os Resultados Brutos na escala de Notas Penta. Simplificando a explicação, as Notas Penta dividem a curva normal em cinco partes, conforme se pode verificar no exemplo abaixo.

 

Uma outra escala frequentemente utilizada é a Escala de Percentis. A escala de percentis ordena os resultados da amostra em 100 partes iguais. Convém, no entanto, salientar que, como a curva normal tende para infinito, não existe o percentil 0, nem o percentil 100, pelo que a escala de percentis varia entre 1 e 99.

O valor do percentil corresponde à percentagem de sujeitos do grupo normativo que obteve um valor igual ou inferior ao do sujeito.

Assim, um resultado situado no percentil 75 significa que 75% dos sujeitos da amostra normativa obtiveram resultados iguais ou inferiores e que apenas 25% dos sujeitos da amostra normativa obtiveram resultados superiores. Imagine uma maratona com 99 participantes – ao último participante a chegar à meta corresponderia o percentil 1 e ao participante que venceu a maratona corresponderia o percentil 99. O participante que ocuparia a posição 75 (ou seja o percentil 75) teria alcançado um resultado igual ou superior a 75 participantes.

Como é que se faz a conversão?

Quando se trata de testes cuja correção é feita utilizando um sistema informático, este processo é automático. Após o profissional introduzir as respostas dadas pelo sujeito avaliado e escolher a tabela de normas com que pretende comparar o resultado, o sistema informático devolve, automaticamente, quer os Resultados Brutos (ou Pontuações Diretas), quer os Resultados Padronizados, conforme poderá verificar-se no exemplo abaixo.

Quando a correção é feita manualmente, há que procurar o valor da Pontuação Direta (ou do Resultado Bruto) na tabela de normas escolhida e que, certamente, fará parte do manual técnico do teste.

Imaginemos, por exemplo, que um sujeito licenciado em gestão obteve os seguintes resultados nos diferentes testes que compõem a bateria BAC – Bateria para a Atividade Comercial.

Agora, basta procurar cada um destes valores na tabela de normas escolhida e ver qual o resultado padronizado que lhe corresponde.

Assim, no teste de Compreensão Verbal, o resultado obtido pelo sujeito avaliado corresponde ao Percentil 75; no teste de Memória e Compreensão de Textos, o resultado corresponde ao Percentil 90 e assim sucessivamente.

Passo 4 | Interpretação dos Resultados

Uma parte da interpretação já foi explicada no passo 3 aquando da clarificação do que são os resultados padronizados.

Nesta etapa trata-se de traduzir o que significam os resultados padronizados em termos da variável psicológica que está a ser avaliada. Por exemplo, imaginemos que se trata de um sujeito que obteve, num questionário de personalidade, um resultado bruto na escala de Extroversão que corresponde ao Percentil 95.

Vamos assumir que, neste questionário, a definição de extroversão corresponde ao gosto por estar com pessoas, pelo entusiasmo e pela exuberância social.

Um percentil 95 significa que 95% dos sujeitos que compõem a amostra normativa com que os resultados foram comparados obtêm resultados iguais ou inferiores aos do sujeito avaliado e que apenas 5% obtêm resultados superiores.

Se estivermos a conduzir um processo de seleção em que o gosto por estar com pessoas seja muito importante, podemos concluir que esta pessoa claramente que se destaca das outras nesta variável.

A interpretação dos resultados deve ser sempre feita tendo em consideração a definição do constructo que está a ser avaliado, assim como a capacidade preditiva do tipo de instrumento que está a ser utilizado.

Por este motivo, não é possível fazer uma utilização adequada de um teste psicológico sem recorrer ao manual técnico da prova ou ao relatório interpretativo dos resultados que, eventualmente, o editor disponibilize.

General Manager Hogrefe Portugal

Magda Machado